O EVANGELHO SEGUNDO O
ESPIRITISMO
Cap. 14 – Honra a Teu
Pai e A Tua Mãe
SANTO
AGOSTINHO - Paris, 1862
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– A ingratidão é um dos frutos mais imediatos do egoísmo e revolta sempre os
corações virtuosos. Mas a dos filhos para com os pais tem um sentido ainda mais
odioso. É desse ponto de vista que a vamos encarar mais especialmente, para
analisar-lhe as causas e os efeitos.
Nisto,
como em tudo, o Espiritismo vem lançar luz sobre um dos problemas do coração humano.
Quando
o Espírito deixa a Terra, leva consigo as paixões ou as virtudes inerentes à
sua natureza, e vai no espaço aperfeiçoar-se ou estacionar, até que deseje
esclarecer-se. Alguns, portanto, levam consigo ódios violentos e desejos de
vingança. A alguns deles, porém, mais adiantados, é permitido entrever algo da
verdade: reconhecem os funestos efeitos de suas paixões, e tomam então boas
resoluções; compreendem que, para se dirigirem a Deus, só existe uma senha –
caridade.
Mas
não há caridade sem esquecimento das ofensas e das injúrias, não há caridade
com ódio no coração e sem perdão.
É
então que, por um esforço inaudito, voltam o seu olhar para os que detestaram
na Terra. À vista deles, porém, sua animosidade desperta. Revoltam-se à idéia
de perdoar, e ainda mais a de renunciarem a si mesmos, mas sobretudo a de amar
aqueles que lhes destruíram talvez a fortuna, a honra, a família. Não obstante,
o coração desses infortunados está abalado. Eles hesitam, vacilam, agitados por
sentimentos contrários.
Se
a boa resolução triunfa, eles oram a Deus, imploram aos Bons Espíritos que lhes
dêem forças no momento mais decisivo da prova.
Enfim,
depois de alguns anos de meditação e de preces, o Espírito se aproveita de um
corpo que se prepara, na família daquele que ele detestou, e pede, aos
Espíritos encarregados de transmitir as ordens supremas, permissão para ir
cumprir sobre a Terra os destinos desse corpo que vem de se formar.
Qual
será, então, a sua conduta nessa família? Ela dependerá da maior ou menor
persistência das suas boas resoluções. O contacto incessante dos seres que ele
odiou é uma prova terrível, da qual às vezes sucumbe, se a sua vontade não for
bastante forte. Assim, segundo a boa ou má resolução que prevalecer, ele será
amigo ou inimigo daqueles em cujo meio foi chamado a viver.
É
assim que se explicam esses ódios, essas repulsas instintivas, que se notam em
certas crianças, e que nenhum fato exterior parece justificar. Nada, com efeito,
nessa existência, poderia provocar essa antipatia. Para encontrar-lhe a causa,
é necessário voltar os olhos ao passado.
Oh!,
espíritas! Compreendei neste momento o grande papel da Humanidade! Compreendei
que, quando gerais um corpo, a alma que se encarna vem do espaço para
progredir. Tomai conhecimento dos vossos deveres, e ponde todo o vosso amor em
aproximar essa alma de Deus: é essa a missão que vos está confiada e da qual
recebereis a recompensa, se a cumprirdes fielmente.
Vossos
cuidados, a educação que lhe derdes, auxiliarão o seu aperfeiçoamento e a sua
felicidade futura. Lembrai-vos de que a cada pai e a cada mãe, Deus perguntará:
“Que fizestes da criança confiada à vossa guarda?” Se permaneceu atrasada por
vossa culpa, vosso castigo será o de vê-la entre os Espíritos sofredores,
quando dependia de vós que fosse feliz. Então vós mesmos, carregados de
remorsos, pedireis para reparar a vossa falta: solicitareis uma nova
encarnação, para vós e para ela, na qual a cercareis de mais atentos cuidados,
e ela, cheia de reconhecimento, vos envolverá no seu amor.
Não
recuseis, portanto, o filho que no berço repele a mãe, nem aquele que vos paga
com a ingratidão: não foi o acaso que o fez assim e que vo-lo enviou. Uma
intuição imperfeita do passado se revela, e dela podeis deduzir que um ou outro
já odiou muito ou foi muito ofendido, que um ou outro veio para perdoar ou
expiar.
Mães!
Abraçai, pois, a criança que vos causa aborrecimentos, e dizei para vós mesmas:
“Uma de nós duas foi culpada”. Merecei as divinas alegrias que Deus concedeu à
maternidade, ensinando a essa criança que ela está na Terra para se
aperfeiçoar, amar e abençoar.
Mas,
ah! Muitas dentre vós, em vez de expulsar por meio da educação os maus
princípios inatos, provenientes das existências anteriores, entretém e
desenvolvem esses princípios, por descuido ou por uma culposa fraqueza. E, mais
tarde, o vosso coração ulcerado pela ingratidão dos filhos, será para vós,
desde esta vida, o começo da vossa expiação.
A
tarefa não é tão difícil como podereis pensar. Não exige o saber do mundo: o
ignorante e o sábio podem cumpri-la, e o Espiritismo vem facilitá-la, ao
revelar a causa das imperfeições do coração humano.
Desde
o berço, a criança manifesta os instintos bons ou maus que traz de sua
existência anterior. É necessário aplicar-se em estudá-los. Todos
os males têm sua origem no egoísmo e no orgulho. Espreitai, pois, os menores
sinais que revelam os germens desses vícios e dedicai-vos a combatê-los, sem
esperar que eles lancem raízes profundas. Fazei como o bom jardineiro, que
arranca os brotos daninhos à medida que os vê aparecerem na árvore.
Se
deixardes que o egoísmo e o orgulho se desenvolvam, não vos espanteis de ser
pagos mais tarde pela ingratidão. Quando os pais tudo fizeram para o
adiantamento moral dos filhos, se não conseguem êxito, não tem do que lamentar
e sua consciência pode estar tranqüila. Quanto à amargura muito natural que
experimentam, pelo insucesso de seus esforços, Deus reserva-lhes uma grande,
imensa consolação, pela certeza de que é apenas um atraso momentâneo, e que lhe
será dado acabar em outra existência a obra então começada, e que um dia o
filho ingrato os recompensará com o seu amor. (Ver cap. XIII, nº 19)
Deus
não faz as provas superiores às forças daquele que as pede; só permite as que
podem ser cumpridas; se isto não se verifica, não é por falta de
possibilidades, mas de vontade. Pois quantos existem, que em lugar de resistir
aos maus arrastamentos, neles se comprazem: é para eles que estão reservados o
choro e o ranger de dentes, em suas existências posteriores. Admirai,
entretanto, a bondade de Deus, que nunca fecha a porta ao arrependimento.
Chega
um dia em que o culpado está cansado de sofrer, o seu orgulho foi por fim
dominado, e é então que Deus abre os braços paternais para o filho pródigo, que
se lança aos seus pés. As grandes provas, — escutai bem, — são quase sempre o
indício de um fim de sofrimento e de um aperfeiçoamento do Espírito, desde que
sejam aceitas por amor a Deus. É um momento supremo, e é nele sobretudo que
importa não falir pela murmuração, se não se quiser perder o fruto da prova e
ter de recomeçar.
Em
vez de vos queixardes, agradecei a Deus, que vos oferece a ocasião de vencer
para vos dar o prêmio da vitória. Então quando, saído do turbilhão do mundo
terreno, entrardes no mundo dos Espíritos, sereis ali aclamado, como o soldado
que saiu vitorioso do centro da refrega.
De
todas as provas, as mais penosas são as que afetam o coração. Aquele que
suporta com coragem a miséria das privações materiais, sucumbe ao peso das
amarguras domésticas, esmagadas pela ingratidão dos seus. Oh! É essa uma
pungente angústia! Mas o que pode, nessas circunstâncias, reerguer a coragem
moral, senão o conhecimento das causas do mal, com a certeza de que, se há
longas dilacerações, não há desesperos eternos, porque Deus não pode querer que
a sua criatura sofra para sempre! O que há de mais consolador, de mais
encorajador, do que esse pensamento de que depende de si mesmo, de seus
próprios esforços abreviar o sofrimento, destruindo em si as causas do mal?
Mas, para isso, é necessário não reter o olhar na Terra e não ver apenas uma
existência; é necessário elevar-se, pairar no infinito do passado e do futuro.
Então, a grande justiça de Deus se revela aos vossos olhos, e esperais com
paciência, porque explicou a vós mesmos o que vos parecia monstruosidade da
Terra. Os ferimentos que recebestes vos parecem simples arranhaduras. Nesse
golpe de vista lançado sobre o conjunto, os laços de família aparecem no seu
verdadeiro sentido: não mais os laços frágeis da matéria que ligam os seus
membros, mas os laços duráveis do Espírito, que se perpetuam, e se consolidam,
ao se depurarem, em vez de se quebrarem com a reencarnação.
Os
Espíritos cuja similitude de gostos, identidade do progresso moral e a afeição,
levam a reunir-se, formam famílias. Esses mesmos Espíritos, nas suas migrações
terrenas, buscam-se para agrupar-se, como faziam no espaço, dando origem às
famílias unidas e homogêneas. E se, nas suas peregrinações, ficam
momentaneamente separados, mais tarde se reencontram, felizes por seus novos
progressos. Mas como não devem trabalhar somente para si mesmos, Deus permite
que Espíritos menos adiantados venham encarnar-se entre eles, a fim de haurirem
conselhos e bons exemplos, no interesse do seu próprio progresso. Eles causam,
por vezes, perturbações no meio, mas é lá que está a prova, lá que se encontra
a tarefa. Recebei-os, pois, como irmãos; ajudai-os, e, mais tarde, no mundo dos
Espíritos, a família se felicitará por haver salvo do naufrágio os que, por sua
vez, poderão salvar outros.
Fonte da imagem: Internet Google.